Variações / Camilo Castelo Branco (1825-1890)
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O que têm em comum os romances Amor de Perdição (1862) e A Doida do Candal (1867)? Qual a relação entre os protagonistas Simão Botelho e Simão Peixoto? É precisamente neste passo que tudo se desvenda e se torna claro que, para Camilo, a relação é mais profunda do que uma simples homonímia: em Simão Peixoto, de A Doida do Candal, o escritor explora ao extremo a personalidade sanguinária e impulsiva de Simão Botelho de Amor de Perdição.
É exatamente aqui que se dá pela primeira vez a variação mais interessante, que se repetirá ao longo do manuscrito: a troca do apelido “Peixoto” por “Botelho”. Isto acontece precisamente no parágrafo seguinte a um passo em que Simão Peixoto é comparado com um tigre: “Era uma visagem de tigre espicassado na gaiola”. Esta comparação recorda-nos imediatamente outra semelhante em Amor de Perdição, relativa a Simão Botelho: “contorceu-se no seu quarto como o tigre contra as grades inflexíveis da jaula”.
Parece ter sido, portanto, este passo que trouxe à memória de Camilo o Simão Botelho de Amor de Perdição, dando lugar, no parágrafo subsequente, ao primeiro lapso de escrita: “Simão < B>/Peixoto”. Note-se ainda que é precisamente no fólio seguinte àquele onde se encontra esta emenda que a coincidência de carácter entre os dois protagonistas se torna explícita, através de uma referência directa ao protagonista de Amor de Perdição e de uma nota de rodapé que remete o leitor para o romance escrito na cadeia: “outro mata-mouros chamado também Simão, há treze anos. (x) Veja o romance Amor de perdição”.