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Eça de Queirós, “Civilização”
Gazeta de Notícias, 16 Outubro 1892, p. 1 [e montagem]
Fundação Biblioteca Nacional, Brasil
Eça de Queirós, A Cidade e as Serras, Porto: Livraria Chardron, 1901, p. 1
Biblioteca Nacional de Portugal
A publicação d’A Cidade e as Serras (1901), logo depois da morte de Eça, coloca este romance na situação de semipóstumo. Àquilo que, ainda em vida do autor, fora composto, juntou-se uma revisão “interventiva”, por Ramalho Ortigão, completada pela leitura e edição do manuscrito de uma (assim chamada) segunda parte do relato. O romance provém de uma expansão narrativa a partir do conto Civilização, aparecido na Gazeta de Notícias (1892; ed. crítica por Marie-Hélène Piwnik, em Contos I. Lisboa: Imprensa Nacional-Cada da Moeda, 2009). Indo muito além do pormenor estilístico, a variação textual assume aqui uma dimensão considerável, tanto na extensão como na reelaboração de importantes categorias narrativas, com efeitos no plano genológico; assim, o que era conto passa a ser romance, como resultado de uma ampliação discursiva que não era inédita em Eça (veja-se, por exemplo, a sucessão das três versões d’O Crime do Padre Amaro; edição definitiva: 1889). O movimento expansivo envolve, entre outros componentes, os seguintes:  cenários e episódios sociais consideravelmente alargados no romance (pp. 68-95; em Civilização, p. 230); aprofundamento  temático da dialética civilização/ruralidade (conto), estendida ao confronto estrangeiro/nacional (de Paris para Tormes, n’ A Cidade e as Serras); investimento na descrição de espaços (pp. 30-32 e 200-203; em Civilização, p. 226); diversificação e figuração circunstanciada de personagens; denominação (Zé Fernandes) e caracterização do narrador, também personagem (em Civilização, era figura anónima); desenlace com tonalidade conclusiva mais acentuada no romance (pp. 377-380) do que no conto (p. 249).

Carlos Reis |

Universidade de Coimbra