De maneira semelhante à mulher na ópera de Verdi, que muda de palavra e de pensamento, assim os textos da nossa cultura literária. Na verdade, por vezes, mudam só de palavra, mantendo-se o pensamento intocado; outras vezes, apesar de a palavra ser a mesma, o pensamento com que a palavra é interpretada vai passando por mudança. E a mudança de que todo o mundo é feito instala-se nos modos como os nossos autores escreveram as suas obras e nos modos como elas foram sendo transmitidas. A variação deixa de ser vista como uma excepção à regra para funcionar como traço intrínseco da condição textual.

Por isso, 40 especialistas de universidades portuguesas e estrangeiras foram convidados a explicar casos notáveis de diferenças nas versões de obras da literatura portuguesa desde a Idade Média até aos nossos dias. Este é o resultado.

Nesta mostra, verá como a variação textual é uma forma de mudança ao lado de outras: na própria língua, na matemática, na música ou na genética. Notará como, quando se edita um texto, a variação é um problema a ser resolvido ou, conforme se comprova em certos poemas de Pessoa ou de Alberto Pimenta, faz parte da identidade do próprio texto. Poderá observar vários estudiosos a raciocinarem sobre documentos perdidos que explicariam certos episódios de variação: é o caso do tratado medieval Orto do Esposo ou de um poema de Cesário Verde. Tem a oportunidade de reparar nas operações de afinação estilística por que passam os textos seleccionados, de escritores tão diferentes como António Nobre ou D. Francisco Manuel de Melo. Também pode acompanhar a contenção auto-imposta ou produzida por instâncias de censura no trânsito entre versões privadas e versões públicas de um mesmo escrito, por exemplo de Bocage. Aprecie ainda como a introdução de uma diferença num lugar da obra cria a expectativa de que outros lugares fiquem sujeitos a modificação. É o que se passa com o ciclo O Guardador de Rebanhos, de Alberto Caeiro. Veja a amplitude da variação textual, ao atravessar idiomas, géneros literários, títulos: do trovador Fernan Garcia Esgaravunha, passando por Camões, a Fernanda Botelho. Considere por fim como a variação se pode manifestar através do próprio aspecto dos documentos e também incluir ou desencadear imagens diferentes do conteúdo textual. São as imagens incluídas ou despertadas pela leitura da versão portuguesa do tratado De Vita Christi, mas igualmente por um romance de Almeida Garrett.

As peças expostas e reproduzidas provêm de bibliotecas e arquivos nacionais e estrangeiros, algumas delas existentes apenas em colecções particulares, e dizem respeito a uma galeria de textos escritos ao longo de sete séculos: desde a lírica trovadoresca até à poesia de Eugénio de Andrade, Herberto Helder e Alberto Pimenta. A exposição não está organizada por sequência cronológica, pois procurou-se salientar fenómenos de variação que são documentáveis em autores de diferentes épocas e em textos de género diverso.

Bem-vindo à mostra sobre variação.  Entre e descubra as diferenças.