Variações  /  Ludolfo de Saxónia (c.1295-1378) 

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Ludolfo de Saxónia, Vita Christi
ALC. 451, [traduzido 1445-1446], f. 4va
Biblioteca Nacional de Portugal
Ludolfo de Saxónia, Vita Christi
INC-1541-1, 1498, f. 6vb
Biblioteca Nacional de Portugal
Ludolfo de Saxónia, Vita Christi
Ordem de Cister, Mosteiro de Lorvão, códice 33, [traduzido 1445-1446], f. 7ra
Arquivo Nacional Torre do Tombo
Comentário bíblico com retrato de Cristo
Fragmentos, cx. 21, n.º 24 [séc. XIV?]
Arquivo Nacional Torre do Tombo

Qual é a relação entre o retrato de Cristo transmitido pela Vita Christi e a sua imagem segundo um fragmento manuscrito quinhentista descoberto no reforço da encadernação de um livro notarial? A variação entre as lições “de collores” e “guazeos” comprova que palavras de um mesmo campo semântico, meras lições neutras a princípio, podem ter peso significativo na classificação genealógica de testemunhos em uma dada tradição. O termo “gázeo”, ‘esverdeado’ ou ‘verde-azulado’, não será uma criação ad hoc de algum copista do manuscrito L, mas sim evidência de um alto grau de conservadorismo da cópia (ou então resultado de um processo de contaminação). A variante mais rara poderá, neste caso, comprovar que os testemunhos mais recentes em uma tradição textual não são necessariamente os piores, e podem conter lições autênticas.

A hipótese da boa lição em L fundamenta-se na identidade deste testemunho com um fragmento  manuscrito que traz um comentário bíblico que refere o retrato de Cristo e que emprega o mesmo termo de L para definir a cor dos olhos do retratado. Teria sido esse texto fonte da Vita Christi, ou mesmo da sua cópia? Não necessariamente, uma vez que circulavam na época diversos textos com a descrição do retrato de Cristo, os quais guardam entre si algum grau de semelhança, por terem, possivelmente, uma ascendência comum (a Epistula Lentuli, apócrifo trecentista de uma carta atribuída a Públio Lêntulo). A lição de L, ao menos neste caso, poderá não só remontar a um testemunho muito conservador, como também indicar um entrelaçamento da tradição da Vita Christi com outras obras contemporâneas à sua circulação. Este quadro tornaria a árvore genealógica da obra mais complexa do que a que hoje podemos reconstituir.

Sílvio Toledo Neto |

Universidade de São Paulo